DO CEARÁ PARA O MUNDO
Depois de anos de estudos e pesquisas, o cirurgião plástico Márcio Crisóstomo desenvolveu uma técnica de transplante capilar e hoje opera pacientes de todo o Brasil e do exterior
A perda dos cabelos é um dos maiores temores masculinos e um problema mais comum do que se imagina, já que atinge mais da metade dos homens na idade adulta. A boa notícia é que os tratamentos para a calvície atuais têm resultados excelentes que deixaram definitivamente no passado o terrível aspecto de “cabelo-de-boneca”. O Brasil conta com cirurgiões plásticos reconhecidos internacionalmente na área de implante capilar. Um deles é o dr. Márcio Crisóstomo, de Fortaleza, no Ceará. Ele desenvolveu uma técnica que permite o aumento do número de fios implantados em uma única cirurgia. Com isso, se tornou um dos profissionais mais requisitados de sua área, já que sua técnica tem alcançado importante repercussão não só no Brasil, mas também em outros países do mundo.
Entre uma viagem internacional e outra, Crisóstomo recebeu PODER em seu apartamento para falar sobre seu trabalho. Ele tinha acabado de retornar de uma conferência em Lisboa. Seguiu depois rumo a Paris a fim de participar de outro congresso científico. Esse fato é comum na agenda do médico que, nos últimos dois meses esteve em cinco países diferentes, como palestrante convidado, com o objetivo de apresentar sua técnica a colegas do mundo todo.
"A calvície mexe não só com a vaidade, mas também com o aspecto psicológico. Alguns pacientes até entram em depressão por sua causa"
PAIXÃO POR PESQUISA
O interesse de Crisóstomo por transplantes capilares começou quando ele ainda estava no Rio de Janeiro, fazendo um curso de pós-graduação com um dos cirurgiões plásticos mais conceituados do mundo: Ivo Pitanguy. Depois de três anos de aprendizado com o mestre e já de volta à Fortaleza, decidiu dedicar-se à área. Buscou no exterior o know-how necessário e até fez um mestrado sobre o assunto na Universidade Federal do Ceará como parte de sua especialização. “No Brasil, temos dificuldade de acesso a treinamentos para realizar o transplante de cabelos. Nos Estados Unidos, essa cirurgia é considerada uma especialidade”, explica.
Em uma cirurgia de transplante capilar utilizam-se os fios da parte de trás e da lateral da cabeça, que não caem. A ideia é fazer a transferência dos fios dessas regiões, que são chamadas de áreas doadoras, para a parte calva. Ao atender pacientes em sua clínica, Crisóstomo notou que os pedidos eram mais ou menos parecidos: os homens queriam mais cabelo do que os implantes tradicionais tinham capacidade de oferecer. Por isso, decidiu pesquisar o assunto. E aqui, vale fazer parênteses, porque a curiosidade científica de Crisóstomo é algo que vem “de família”: seu pai, João, um cientista com doutorado em Genética pela USP, ia fazer pesquisas na biblioteca da universidade e levava o filho com ele.
Depois de muitos estudos, Crisóstomo chegou a uma técnica inédita de transplante capilar indicada para casos de calvície avançada. Batizada de Untouched Strip – “faixa intocada”, em português –, o procedimento consiste no aprimoramento e na combinação das duas técnicas já conhecidas e utilizadas. Na técnica mais tradicional e consagrada, o cirurgião remove uma faixa do couro cabeludo para extrair os fios. Em seguida, eles são preparados em microscópio antes do implante. Esse procedimento fornece uma quantidade maior de cabelo, resultando em um implante de maior porte. Conhecida como Folicular Unit Extraction (FUE), o outro tipo de implante capilar utilizado atualmente, tem um processo mais artesanal, já queos fios são retirados um a um. A principal vantagem é evitar uma cicatriz na parte de trás da cabeça. Por outro lado, por render menos material, a FUE é ideal para pacientes com pequenas falhas ou graus mais leves de falta de cabelo.
Geralmente, essas duas técnicas são utilizadas de forma isolada. O dr. Crisóstomo padronizou uma maneira de unir as duas para obter mais fios da área doadora. “Com essa combinação, potencializamos a área doadora do paciente e, ainda, a preservamos para uma utilização futura, se houver necessidade”, explica. Mas a metodologia desenvolvida por Crisóstomo vai muito além da simples combinação dos dois procedimentos. Primeiro, porque, depois de realizar a cirurgia tradicional, ele utiliza a FUE para aumentar em média 30%, podendo chegar a mais de 40% o número de fios implantados, o que torna possível preencher zonas de calvície avançadas que apenas uma das técnicas não daria conta de corrigir.
O grande diferencial da Untouched Strip fica por conta de um detalhe fundamental: a preservação de uma área logo abaixo da faixa de couro cabeludo extraída inicialmente, que funciona como uma espécie de reserva para ser utilizada caso seja preciso fazer um segundo implante. “Com o tempo, alguns pacientes podem sentir necessidade de passar por um novo procedimento e a preservação dessa área é fundamental para que a realização de uma nova cirurgia seja possível”, diz.
“A Untouched Strip combina duas técnicas e aumenta em média 30% o número de fios implantados”
SEM FRONTEIRAS
Com o sucesso de sua técnica no meio médico e acadêmico e, claro, entre os pacientes, Crisóstomo comanda uma das maiores equipes cirúrgicas do Brasil para transplantes capilares. Segundo ele, com a introdução da Untouched Strip,houve uma inversão do fluxo do capital intelectual. “Muitas vezes, os avanços médicos vêm de fora do Brasil, mas procuramos criar algo novo aqui no país”, afirma o cirurgião que, além da clínica em Fortaleza, atende com freqüência uma clientela selecionada em Brasília.
Pacientes espalhados em todo o país e publicação da técnica em importantes revistas científicas fizeram com que a Untouched Strip se tornasse conhecida no exterior. O novo procedimento também lhe rendeu o convite para integrar o seleto Comitê de Pesquisa em FUE da ISHRS – sigla em inglês para Sociedade Internacional de Cirurgia de Restauração Capilar – que conta com apenas 15 membros no mundo, sendo que Crisóstomo é o único representante da América Latina.
Atualmente, o médico tem seu passaporte carimbado com frequência por causa dos vários convites que recebe para realizar apresentações fora do Brasil. Ele já fez em países como Itália, Áustria, Alemanha, Portugal, França, Suíça e Bahamas. E, em alguns congressos, chegou a levar pacientes operados a fim de apresentar a Untouched Strip ao vivo e em cores para colegas do mundo inteiro.
NADA ACIDENTAL
Engana-se quem pensa que Márcio Crisóstomo é monotemático e só sabe falar sobre medicina e cirurgias de transplante capilar. Nada disso, já que ele tem vários outros interesses. Seu gosto musical, por exemplo, é dos mais ecléticos e ele é também um cinéfilo de carteirinha – gosta de clássicos franceses a filmes modernos – toca flauta e saxofone e passa horas na biblioteca de sua casa, que tem estantes forradas de livros de arte, arquitetura, cinema, fotografia e de obras da literatura brasileira e estrangeira.